Nessa época o pessoal anda preocupado com a bebida e com a comida. Preocupados de verdade se realmente vão ter o suficiente, por que o momento é de festa, é alegria da beberragem. Quem menos se preocupa são as crianças, canso de observa-las pelas ruas com suas pipas chilenas. É uma brincadeira de adulto, até nós compramos as nossas, prontas, de plástico, dois mil pesos. Ainda não consegui subir a pipa, talvez por que não tentei.
O vento é sempre forte nos litorais, foi o que me pareceu. A uns anos atrás o vento era tão eficiente quanto agora, entretanto não recordo que seja tão frio. Nos dispomos na calçada, a querida Sexóloga correu um pouco mais para frente e soltou a pipa no ar enquanto o Vizinho manobrou a linha em movimentos ritmados, cuidando o quanto largava de linha e acompanhando o trajeto que ia fazendo. Plástico colorido no ar ia pouco a pouco subindo. No meu ângulo de visão os fios de luz já eram um problema e inevitavelmente imaginei o fio tocando o cabo de tensão e o Vizinho brilhando aparecendo ossos para logo em seguida retornar a carne de forma chamuscada, como um bom desenho animado.
Acabou subindo e subindo, alegria. John se apoderou do carretel e começou a puxar um pouco o brinquedo. Talvez seja questão de mão, um jeitinho para puxar o suficiente ou ter um pouco mais de carinho com o bicho. Em instantes estava como um touro brabo voando, brigando para sair da linha, era círculos fechados em torno da linha, louco ele ia descendo como um helicóptero com falha mecânica. Escutei o zunido da aeronave caindo por trás de uma casa enquanto os pés corriam para fazer o resgate.
O fio que indicava o caminho era branco e se perdia olhando contra as nuvens floquinhos do céu, dei a volta na casa, não havia portão nem cerca nem ninguém. Estava vazia e havia uma curiosa piscina para crianças que certamente a água não alcançaria nem no meio da coxa. Piscina de fibra desse tamanho, que coisa engraçada. Estava vazia e a pipa não estava dentro, nem ao redor.
Era um pequeno chalé de duas cabanas pequenas que se posicionavam diagonalmente uma a outra. Talvez esteja entre elas. Não. Também não. O fio desaparecera. A Sexóloga apareceu preocupada e curiosa, tampouco avistou a aeronave. Voltando observamos o fio contra o céu num azul perfeito, agradável aos olhos protegidos pelas lentes de aviador. Aqui!
Muro de uns dois metros, pré-moldado em concreto. Perigo de se pular pelo meio com chapas tão finas, pois bem, usei um dos pilares e com facilidade saltei para o outro lado num terreno baldio com vegetação tropical seca. Algumas moitas, algumas coisas com espinhos, mas foi fácil chegar até ela. O arbusto era baixo e foi fácil agarrar a pipa. Cortada a linha e desmontado levei a ave abatida em meus dentes para facilitar o pulo de retorno. A Sexóloga aliviada pelo seu brinquedo estava faceira, aprontou uma pequena escada com paus para descer para o outro lado, não era necessário, mas ela queria ajudar de alguma forma.
As mãos meio rachadas, um pequeno esfolão próximo ao cotovelo e o pó de concreto nas mãos e braços. Dever cumprido, satisfação.
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