quinta-feira, junho 2

Moto

Estava voltando pra casa. Muito frio, a jaqueta de couro e dois blusões ainda eram insuficientes contra o vento de 80km que a moto trazia a tona. Logo antes de subir uma lomba para entrar na cidade, via-se a via iluminada por cones de luzes amareladas que formavam os postes devida a forte neblina. O frio era intenso, e aqueles antigos pensamentos chegavam a sua cabeça. As dúvidas sempre certas e os pensamentos mais claros se firmando novamente, uma alma de alívio o tomava quase imediatamente.

As dúvidas e besteiras que iam se formavam automaticamente se dissipavam com o ronco da moto. Eram pensamentos mesquinhos e inúteis que seguidamente assombravam suas idéias tomando espaço das coisas de maior valor.

Foi então que numa curva em que propositalmente ele conseguiu fazer a moto derrapar ao acelerar e incliná-la, que sentiu aquela onda de idéias simples e objetivas tomando-lhe a cabeça. Existem os acomodados, existem os incomodados e existem os 'inquietos'. Lembrou que era híbrido, um meio a meio meio besta, tinha lá seus objetivos e adorava desafios, isto ao mesmo passo que adorava fazer coisas repetitivas de forma sistemática e sem desvios de percurso.

Tudo aquilo passava de sua mente como sempre passou e como certamente voltará a passar, aquela unica certeza era a inconstância constante. Abriu a viseira embaçada e desceu da moto. Deu uma bela olhada para o céu negro levemente estrelado e foi para casa.

--

O que precisava mesmo, era disso, de uma loira gelada antes de dormir, daquelas que nos balança a cabeça até o momento de deitar a orelha no travesseiro.

quarta-feira, fevereiro 16

De volta

Fazia o que? Acho que mais de mês que ela estava lá, deitada num canto, gélida, levemente loira. Coisa linda de se ver, era bastante quieta e doce. O toque dela na boca era marcante, daqueles que tu não entende o que esta acontecendo até que finalmente sua língua é completamente domada.
Confesso que antes de cair de boca saquei o chapéu dela com carinho, sem balançar nem nada. Abri a Baden Baden Ale Golden com um pouco de remorso, ela estava lá descansando fazia algum tempo, mas hoje... hoje eu tive que me exaltar, passar por cima das últimas. Hoje eu me vi no espelho, nú. Risadas, muitas risadas.

Sim, estava eu, barbado, bêbado e nú com a mão no bolso.

--

Ele se levantou com um gosto ruim na boca. Tateando o chão achou seu celular com alguma dificuldade, finalmente acertou a combinação de botões para desbloquea-lo e fazer o alarme parar. Maldita campainha das antigas. O trim trim era um sino gigante gritando em seu ouvido (pense numa pessoa vestida de sino gritando "triiimmm!!!").
Depois daquele suspiro de alívio junto do primeiro instante de silêncio, ele se virou e olhou para o teto.
- Ahhh que canseira.
Voltou a dormir.
...
Acordou.
Estava sentindo que o dia estava na metade. Sua barriga roncava e até então ele ainda não tinha nem levantado, sequer lavado o rosto. Era só mais um daqueles dias solitários de sábado, quando nos levantamos dizendo que nunca mais vamos beber, mas ali pela tardinha já preparamos mais uma caipirinha.
O primeiro passo foi revelador. Maço de Marlboro vermelho com apenas uns três ou quatro cigarros. Deu umas mascadas no nada com saliva e lembrou que era esse mesmo o gosto na boca. Foi no banheiro e se lavou. Parou um pouco olhando no espelho lembrando o que fez ontem...
- Cerveja, amigos, cerveja, mulheres estranhas, cerveja, amigos, mulheres bonitas, cereja, amigos, cerveja, mulheres maravilhosas.
Riu sozinho antes de escovar os dentes.
Buscou um livro pequeno, daqueles de bolso, LM&PM, e foi se sentar na sala para ler. Acabou sentado olhando pela janela com os pés escorados numa cadeira na frente do sofá em que estava. Não leu nada, nem viu nada, parou para pensar.

- As vezes penso que seria melhor viver numa época mais lenta, cômoda. Algo como eras medievais ou muito antes disso, em tribos e vilas isoladas de tudo, em pequenos mundos.
- Ia ser tri massa.
- Podcrê!
- ahhahaah
Sorriso.
- É, confesso que essa de conversar é nova pra mim. Mas é legal, me sinto estranho, mas é bom, é como um auto psicólogo.
- Legal né? Mas tu vai me pagar em cerveja!
- Só se for agora!
Levantou e buscou uma na geladeira. E pensar que havia até imagino a idéia de parar de beber.
- Agora sim, podemos continuar.
- Sim doutor.
- Bom, eu sinceramente não tenho reclamações. Eu tenho tudo, e sinto que posso ter tudo.
- Sinto é coisa de viado.
- É... mas para nunca fui macho, segundo um teste na internet, o fato de possuir meias brancas já era um sinônimo de viadagem, visto que branco combina com muita roupa e macho que é macho não pensa se está combinando...
- É...
Olhou suas meias. Cinzas. Alivio.
- Bom, negócio é que mesmo não tendo do que reclamar, eu não consigo parar de reclamar, eu vejo os problemas, vejo as coisas erradas e me sinto mal com elas.
- Exemplos?
- Bom... ah, sei lá po, não lembro de cabeça, mas... bah, não sei...
- Uma merda quando isso acontece né? Tu sabe, tu eventualmente lembra e passa por certas situações seguidamente, entretanto, nunca temos um exemplo na ponta da língua.
- É...

A quietude voltou quando terminou um outro copo, olhava ainda para a mesma janela, tinha sol lá fora e o formato do prédio atrás dele lembrava alguma espécie de gigante. Ele via aquela sombra como se estivesse viva, e fitando as nuvens sem focar em nada, via guerreiros, alguns que cavalgavam, outros andavam no meio do azul, tinha dois com lanças, ou eram rastros de jato...

---

Tocava rock no rádio, era a bateria de ar que ele sempre tocou, aquela de manter um ritmo no chipô e de tempos em tempos dar umas batidas bem dadas no prato, era raiva que se dissipava daquelas coisas que ficam trancadas na garganta, aquela coisa de se expressar, aquela coisa...

terça-feira, janeiro 25

Sobre a burrice, segundo ato

O principal deve ter sido a audição. Ele sempre escutou melhor que falou, sempre deu ouvidos a todos, foi levemente empático, desde sempre, ah isso muda tudo.
Como pedras que rolam e quebram ao esbarrar em outra maior, ou estraçalham as árvores, ele ouviu e aprendeu, ficou quieto atrás daqueles galhos, atento assistindo.
Muitos pontos, várias opiniões, todas certas e talvez erradas. O problema foi que ele deu ouvidos demais, achou que era legal compartilhar seus feitos, todos eles. Dos mais podres aos mais celebres, estes últimos, talvez fossem apenas dois.
Triste ver que provavelmente era o único que partilhava suas desgraças, não eram engraçadas, ele era ridículo, patético. Algum pode dizer que era coragem, ou algum tipo de bravura burra, como contar ao inimigo seu ponto fraco antes de começar a luta. A postura era levemente curvada, naturalmente rebaixado.
Ouviu, por fim, que as coisas mudam, que isto pode acontecer e talvez em alguns casos, deva acontecer. As coisas podem parecer horrorosas, ou o medo pode subir pelos calcanhares e chegar a avermelhar um rosto em instantes, mas as coisas podem ser diferentes... as vezes.

--

Subterranean Homesick Blues


Johnny's in the basement
Mixing up the medicine
I'm on the pavement
Thinking about the government
The man in the trench coat
Badge out, laid off
Says he's got a bad cough
Wants to get it paid off
Look out kid
It's somethin' you did
God knows when
But you're doin' it again
You better duck down the alley way
Lookin' for a new friend
The man in the coon-skin cap
In the big pen
Wants eleven dollar bills
You only got ten


Maggie comes fleet foot
Face full of black soot
Talkin' that the heat put
Plants in the bed but
The phone's tapped anyway
Maggie says that many say
They must bust in early May
Orders from the D. A.
Look out kid
Don't matter what you did
Walk on your tip toes
Don't try "No Doz"
Better stay away from those
That carry around a fire hose
Keep a clean nose
Watch the plain clothes
You don't need a weather man
To know which way the wind blows

Get sick, get well
Hang around a ink well
Ring bell, hard to tell
If anything is goin' to sell
Try hard, get barred
Get back, write braille
Get jailed, jump bail
Join the army, if you fail
Look out kid
You're gonna get hit
But users, cheaters
Six-time losers
Hang around the theaters
Girl by the whirlpool
Lookin' for a new fool
Don't follow leaders
Watch the parkin' meters

Ah get born, keep warm
Short pants, romance, learn to dance
Get dressed, get blessed
Try to be a success
Please her, please him, buy gifts
Don't steal, don't lift
Twenty years of schoolin'
And they put you on the day shift
Look out kid
They keep it all hid
Better jump down a manhole
Light yourself a candle
Don't wear sandals
Try to avoid the scandals
Don't wanna be a bum
You better chew gum
The pump don't work
'Cause the vandals took the handles

--

Não escutou mais nada, não viu nada. Não ouviu risos, não eram vaias, tão pouco lembra de aplausos. Mas voltou, em pé.
Caminhou até a roda de pessoas, ali, na seguinte cerveja, o medo seguia o mesmo, mas a coisa toda, a sua postura... o orgulho da vergonha. Era aquela bravura burra se mostrando útil, enfim.

sexta-feira, janeiro 7

Receita masculina

Junto dois pares de amigos, sendo um deles um belo casal de mente aberta.
Unte seus estômagos com pão líquido à gosto. (preferencialmente da região da Bohemia da Rep. Tcheca).
Sirva piadinhas junto de picadinho, com pitadas de conversas sérias e "papos-cabeça", deixe um ar numa temperatura agradável e bebam com moderação.

Simples, mas muito tri.