segunda-feira, novembro 18

Arte

Depois de algum tempo vi algumas discussões sobre o que era arte. Que era tudo, que era nada, afinal, se é tudo, então nada é arte pois não tem diferença, ou se nada for tudo então... chega.

Foi depois de comprarmos uma câmera fotográfica fodastica que terminei achando bem besta a ideia de fotografia ser algo tão valorizado. Lembro logo de pensamentos que me cruzam a cabeça sempre que vejo uma bela paisagem. Aqueles momento que tu olha, montanhas, sol, nuvem, ou céu azul... pois é, tudo tão bonito, tão incrivelmente belo que chego a desvalorizar esses momentos. É como se fosse sempre a mesma coisa, a mesma ladainha, o que era de valor era estar naquele momento ali, não o fato de tentar grava-lo para uma reprodução posterior. Indiferente da qualidade do retina display, o fato de não ter o meu campo de visão, sentir a temperatura do lugar, o vento, perceber o cheiro do lugar, acaba fazendo com que um belo momento de final de filme seja só um finalzinho clichê sem nenhuma graça.

Arte é um negócio que não agrega absolutamente nada. Talvez alguém diga que diz muito a respeito da cultura, da evolução social e etc, mas igual não consigo ver isso tão claro. Acho que seria mais fácil alguém relatar isso que pintar quadros e depois de anos tentarmos identificar tendências e supor causas. Tanta coisa útil pra se fazer, junta um rabiscos e aquilo vale não sei quanto. O cara morre, vale mais ainda, afinal ninguém vai rabiscar tão bem. Até valorizo um pouco novas técnicas que essas caras inventem, como se fazer tal coisa, mas ainda assim... ninguém se apega a esse tipo de conhecimento, se apega somente ao peixe não a pescaria.

Eu sei, as músicas... são arte, são entretenimento e não vivo sem. Mas, mas... não sei, acredito que ela possuam um propósito melhor, o entretenimento desse nível é maior, não é?
Não me desviem, eu queria falar especificamente sobre fotos! Fotos são úteis pra tentar te trazer de volta ao lugar que esteve, de alguma forma transportar aquela lembrança para mais próxima do lobo frontal afim de reviver o que passou. Foto artística entretanto, aquela coisa de efeito, de série de fotos retratando o rabo de pessoas, ou o sofrimento, ou a alegria... essa coisa artística... por deus. Isso pra mim é alguém que não sabe fazer dinheiro de forma que agregue valor ao mundo e fica criando essas tralhas inicialmente interessantes, mas de fundo oco. É alguém sem ter o que fazer de útil que infelizmente tem iniciativa.

Acredito que o ponto final da discussão toda seja a inteligência intrínseca dos ditados populares.
Está nos olhos de quem vê.

quinta-feira, setembro 5

Traição

Engraçado como os relacionamentos se desenrolam, um dia tu é um completo estranho, no seguinte é aquele amor completo. Foi num dia de verão qualquer que o conheci, desde uma indicação familiar, devia ir lá, marcar encontro e deixar ele fazer o serviço.
Fui vê-lo algumas vezes e não demorei a me apegar. Na segunda ou terceira já estava trocando figurinhas e conversando mais do que 'trabalhando'. Foram períodos de encontros quase mensais, mesmo que apenas pra trocar umas ideias, as coisas foram ficando quase estáveis.
Tive que viajar, foi o destino, coisa que aparece na vida e te faz loucuras, é aconteceu, a culpa não era minha. O abandono foi repentino, num determinado dia o avisei, era clara sua feição de tristeza, de saber que este alguém o deixaria, mesmo que por tempo indefinido, o deixaria, ele sabia, eu sabia, não seria fácil.
Depois de um ano separados, nem nos falamos, foi simplesmente aquela coisa se afastando até que voltei. A necessidade falou alto, não demorei e tive que ligar. Ninguém atendeu, e agora, raios. Ligo amanhã. Nada.

- Alô, alô? - Aquele tom ofegante de um re-encontro.
- Oi? - Não era ele.

A conversa se desenrola e vejo que vou terminando mandando um frio e cru e-mail, mesmo tentando ser simpático, eu sei que não é a mesma coisa, mas é alguma coisa. Enviei o e-mail, finalmente ele respondeu. Poderemos nos encontrar semana que vem, no lugar de sempre, terça. Ele respondeu finalizando com saudades.
É tão bizarro esse relacionamento entre homens carros e mecânicos que até me sinto um traidor de não trazer uma lembrancinha pra ele...

domingo, abril 21

Torta

Começando com barba feita e deixando roupa pronta pra sair, foi assim que deixou o apartamento e se dirigiu ao trabalho, era uma tarde bonita de quinta e tudo que ele pensava era em terminar o dia. Ansioso estaria indo de encontro a garota do bar.
Chegou no horário e foi o pró ativo do ano, aquela inquietude deixou até o caixa meio desconfiado.

- Fala sério, foi por causa da guria de ontem?
- Bah tche, consegui um encontro com ela hoje.
- Que beleza guri! Mas e ai, pra onde vai levar ela?
- Vamos no Mr Pool, nada de mais, quero ver como vai estar, to meio ansioso que é um dos poucos encontros de cavalheiros que faço.
- To ligado...
- Claro, normalmente a gente chega no buteco e já tenta cair em cima, ou então numa baladinha vem perguntar o nome e assim as coisas vão... não sou acostumado com isso, marcar encontro.
- É, encontro é um negócio engraçado.
- Aha.
- Sim, tu sabe por que está indo, a outra pessoa também. Ele pensa em sexo, ela em futuro.
- Claro, e eu diria, ele já a aprovou e só quer executar o sexo, e ela que normalmente impõe os limites e vai realmente testar se o cara sabe se portar, ou se é válido para tal...
- São fazidas, essa é a real.
- Sim né, to chamando a guria pra sair, é pra que? Pagar a conta e dar só bons risinhos? Vou te contar...
- Tá legal que algumas até são reais boas companhias, mas mesmo assim, uns amassos são mais do que necessários.
- É tipo cereja do bolo nesses casos, mas se é uma tonta tapada, nada melhor que só uns amassos, assim elas ficam quietas com as bocas bem ocupadas.
- Isso se não for mais que a boca!
- Bah! - Nesse momento ele foi se distanciando, terminando de organizar os talheres que vinham recém lavados da cozinha, colocar os pratos no lugar, arrumar algumas cadeiras corretamente. Logo o dia realmente começou, o almoço deixou o ambiente barulhento, entre talheres e conversas.

 --

- Bah cara, dia cheio hoje hein. - Comentava o cozinheiro depois de soltar a fumaça compartilhando o cigarro do fim de espediente.
- Nem me fale, eu tenho que ir correndo pra casa agora.
- Ueh, mais coisa pra fazer?
- Vou sair com uma guria mais tarde, daí né, dar um trato. - Respondeu sorrindo enquanto fazia um estilo elvis alisando o cabelo para trás.
- Hehhehe, tá certo. Quer um? - Lhe oferecia um cigarro.
- Bah, vou aceitar, recém acabaram os meus, aliás, tenho que comprar antes de sair, imagino que ela fuma também, acho que nunca me dei conta disso - Com cigarro na boca buscando caixa de fósforo nos bolsos da calça, o amigo lhe oferece fogo, ele apenas se inclina e fuma um último cigarro antes de deixar o lugar.

Fim do seu turno no dia, normalmente trabalhava dois turnos direto pra ganhar mais grana, mas resolveu fazia umas duas semanas que começou a pedir só um turno na quinta e na sexta, assim ficava mais livre pra sair e ficava menos cansado para o fim de semana.
Saiu do restaurante e foi direto comprar seus cigarros, era um passo rápido, queria chegar a tempo tranquilo. Na esquina na saída do bar não tinha Marlboro orginal, foi o light. Concluiu que talvez fosse até melhor, caso ela não goste de cigarro, ao menos é mais fraco, aproveitou e comprou uns chiclês e bala de menta, assim talvez resolvesse o problema, caso ela não gostasse, claro, claro que resolveria.
No JK foi rápido no banho, rápido em se arrumar, o problema era na saída, se deu conta que existia a possibilidade de levá-la para casa.

- Vai saber? - A eterna esperança do rapaz.

Demorou pouco tempo para arrumar o minúsculo JK, entulhou tudo o que pode do chão para dentro do armário, varreu o chão e lavou o que tinha de loça. O quarto estava praticamente limpo, a cama escondia bem a sujeira de baixo dela, assim como o armário se manteve fechado sem explodir nada para fora. Nenhuma roupa no chão. Nem parecia seu apartamento. Estava prestes a sair e sentou pra por uma música, fumou um cigarro, ouviu Júpiter, Miss Lexotan. Apreciou o apartamento como estava, e pensou em colocar algumas músicas pra depois.

- Tá bom, chega, nem vi a guria e já to colocando playlist? - Um olhar de relance ao relógio do computador - Caralho!

Eram cinco pras oito e ele demorava uns quinze a vinte minutos caminhando para o restaurante. Saiu correndo, deixou o note ligado. Mal fechou a porta e se largou em perna. Correu rápido no começo e se deu conta que chegar ofegante poderia parecer ruim, ou quem sabe chegaria até a suar, não tinha certeza. Manteve uma velocidade moderada, e chegando a uma quadra do restaurante, foi caminhando, passo rápido, meio justo.

- Buenas! - Comprimentou o pessoal do restaurante e sentou-se. Era oito e sete. Não era um grande atraso, não era possível que ela não aguentasse esperar tão pouco. Levantou-se, tenso, foi perguntar se a guria tinha aparecido.
- Não vi não, acho que não apareceu.
- Tem certeza? Uma morena, meio fofinha, mas tri massa.
- Não, sim, eu lembro quem era, acho que teria notado. Mas tu não ia no Mr. Pool?
- É que combinamos de nos encontrar aqui primeiro, pra ninguém ir na casa de ninguém, não ser tão invasivo, achei que seria melhor.
- Ah tá... mas não cara, não vi. Vê com o Guilherme, talvez ele tenha visto. - Garçom novo, começou no mesmo dia e estava responsável pelas mesas da rua.
- Cara, tem certeza que não viu?
- Olha, como tu está descrevendo, não. As duas morenas que ví, uma era alta e a outra era magra, acho que não conta.
- Ela não é gorda, assim, gorda, é fofinha, tipo encorpada sabe?
- Claro, te entendo, mas digo, a que eu vi era bem magra. Não deve ser, e já foram embora.
- Bueno, tá. Valeu igual.
- Aha.

- Ah, que merda. - Pediu uma cerveja e sentou-se numa mesa na parte de fora, fumou e bebeu sozinho, olhou, esperou, relógio, cerveja, cigarro.

Olhava o relógio, oito e vinte e dois.

- Tão atrasada? Quero ver o que ela vai dizer... - Pensava - Que diabos vai dizer? Me fazer esperar tanto, bom, acho que pode ser legal igual, saímos e, bueno... Raios.

Oito e quarenta, e o sentimento era de raiva com desprezo. Já não queria mais nem saber da guria. Embora sua amargura fosse aumentando, sabia que se ela chegasse com uma boa desculpa, ou um motivo real, não haveria problema. Ele queria pensar que não seria assim, que ela chegaria e ele poderia ficar puto da cara e se mandar sozinho, mas na real ele gostou dela.
Como era o código do lugar, retirou a cerveja de dentro do isopor, e chegou o cara novo pra trocar.

- Mais uma?
- Aha. - Nem olhou pra ele, estava puto da vida, já era quase nove e ele ali plantado feito um idiota.

Ele chegou, deixando a cerveja e comentou.

- Mas e aí, e a guria?
- Sei lá cara, acho que me deu o bolo.
- Que merda, heheheh.
- É, caralho.

Terminou bebendo mais ou menos o que imaginava gastar, bebeu sozinho até por volta das três, quando encheu o saco e esvaziou os bolsos.

- Desgraçada.

segunda-feira, março 18

Esperanças

É acordar cedo, é acordar tarde, sempre o seu desejo
O encontro com os amigos, eternos, velhos
A caminhada noturna, diurna entre gramados verdes
Sempre verdes, os olhos
Os sonhos que devem ficar
A ambição eterna do coração
Mentes que não podem enferrujar
Faça de novo, seis vezes
Joelhos velozes e indolores
A chegada da redenção
Ainda os sorrisos, nos olhos
Chuva pelas juntas
Deveres cumpridos, direitos defendidos
Luta seja pelo justo, o necessário
O motor que ronque seja em v ou boxer
Que o conhecimento se acumule e se espalhe
Entre os filhos, entre os netos, as alegrias
As novas altas
Esperanças

domingo, março 17

Pêssego 1

- Bom dia, o que deseja?

Era ela novamente, Muriel, sentada da mesma forma de sempre, largada e pra variar, lendo. Por alguma razão essa morena baixinha começou a frequentar o lugar, pedia sua bebida, eventualmente uma cerveja e se colocava pra ler. Inclinada pra frente, usando a mesa pra apoiar o livro, como se estudasse ou fosse algo realmente importante e urgente.

- Bah, me trás um suco de laranja.
- Acabou, posso te oferecer de pêssego ou maracujá.
- Não, maracujá não, vou acabar dormindo aqui. - Ele respondeu com um sorriso enquanto ela continuou.
- Então pode ser de pêssego mesmo.
- Beleza.

Serviu o suco numa taça bastante adornada, levou na bandeja e aproximou-se dela.

- Com licença.

Ela já estava lendo, ele repousou a taça sobre a mesa enquanto ela se afastou um pouco do livro e se recostou na cadeira. Ela o fitava, ele não percebeu e ao largar o suco tentou ler algum trecho do tal livro.

- É um romance.
- Como se chama?
- Conde de Monte Cristo, é bem bacana.
- Acho que já vi o filme...
- Ah sim, tem o filme também, dizem que o último é bem bacana.
- Mas eu achei que o livro fosse maior, parece tão fininho. - Era quase uma bíblia.
- É que a história do livro é bem mais longa, nesse caso eu tô no segundo volume, mas são três livros mais ou menos do mesmo tamanho.
- Bah que loucura, to tentando ler umas coisas meio...
- Cezar! - Lhe gritam da cozinha.
- Desculpe, tenho que ir.
- Claro...

Ele logo se manda correndo, bandeja na mão, em direção ao caixa. Mal chegando, o caixa logo lhe diz com uma cara fechada.

- Mesa cinco.
- OK - Nem para, contorna a mesa ao seu lado e se dirige para a cinco. Pediram uma alaminuta especial, volta com o pedido, e como ninguém o chama, se posiciona ao lado da caixa.

- Olha cara, eu sei que é tri tagarelar e tal, mas tu está sozinho hoje e temos algumas mesas, por favor, faça bem teu trabalho.
- Desculpa, mas tu viu?
- Sim sim, eu vi. Ta tri.
- Adorei aquela pele morena.
- Tu não tava namorando?
- Justamente, estava. Faz umas três semanas que terminei.
- Bah, que pena... quer dizer, que pena?
- Não, tava um saco mesmo, a guria era tri, boa de cama e tal, mas não tava rolando. No fim era mais esforço pra ficar com ela que qualquer outra coisa.
- Que merda, mas ah, tu...
- Não, nada, to sereno, as coisas passam, mas sério, aquela morenaça ali me chamou atenção e ainda ta dando trela.
- Sim eu vi que conversaram outro dia, ela apareceu mais vezes, né?
- Aha, perai... - Um cara lhe chama de longe, aquela levantada de mão meio tímida.

O pedido que mais sai nos últimos tempos, a tal Alaminuta Especial. É a típica alaminuta, arroz branco, carne, batata frita, tomate e alface, o especial é um pequeno pedaço de frango uma porção de repolho e finalmente o molho especial do local. Os clientes acabaram gostando do almoço barato e bem produzido terminando por fidelizar um par de empresas das redondezas, conveniente para todos.

- Tem saído bastante essa especial hein.
- Bah, foi uma bela sacada do cozinheiro.

Mal comentava com o caixa e saía o seguinte pedido, olhou por baixo da janela entre a cozinha e o saguão e cumprimentou o cozinheiro.

- Te puxou hein! O pessoal ta adorando.
- Hehhehe, valeu. - Uma saudação de cabeça e cada um seguiu no seu trabalho.

Algumas mesas mais chegaram, pedidos ali, um par de negociantes apenas com café e salgado na hora do almoço e por fim ela terminou de tomar seu suco. Ele a avistou de longe e aproveitou para limpar algumas mesas, chegou finalmente na dela para levar a taça.

- Que tal?
- Muito bom, mas agora deu fome.
- Pois é, estranhei, normalmente tu chega no fim da tarde, ehheheh
- Ah sim, hoje tirei folga quis aproveitar pra me distrair.
- Bom, já é uma hora mas ainda temos almoço, se quiser.
- Claro, pode trazer o menu?

Foi e voltou com o menu em mãos.

- Aqui está.
- Eu sou bem indecisa pra essas coisas, acho que até hoje não tinha comido nada que não fosse um pastel ou picadinho por aqui.
- Tu que sabe, mas te poderia sugerir a Alaminuta Especial, tem saído bastante.
- Não é muito grande?
- Não, tem mais variedades, mas porções menores. Adiciona frango, repolho e um molho especial.
- Parece bom, mas igual deixa eu dar uma lida.

Ele parou ao lado, pronto para o pedido. Ela leu com agilidade, mas a decisão não foi nada rápida. Aqueles trinta segundos passados, talvez um minuto, ele estava se movimentando para deixa-la escolher com calma até que ela fechou a carta.

- Tá certo, vou aceitar. Que seja uma Alaminuta Especial.
- Algo mais para tomar?
- Amm, outro suco.
- Pêssego?
- Pêssego.

Assentiu com a cabeça e saiu. Não demorou estava de volta com o suco.

- Daqui a pouco chega a alaminuta.
- Beleza.

Mal deixou na mesa a taça e ela bebericou do canudinho.

- Bom?
- Sim, muito bom. Adorei o suco... Mas então, tu contava que lia o que?
- Ah sim, eu gosto de ler, mas ultimamente to meio relaxado, leio muito devagar.
- Sim, mas o que tu lê? Revista? Jornal? Antes tu ia dizer que eram coisas meio alguma coisa, fiquei curiosa.
- Ah, ehhehe, sim, amm... eu não deveria dizer isso, mas são contos... né...
- Eróticos. - Ele meio sem jeito, mas ao mesmo tempo tranquilo.
- È.
- Não devia ter contato mesmo, seu pervertido. Isso é coisa pra se dizer num restaurante, e tu ainda trabalhando como garçom? - Ela parecia séria, mas os olhos mostravam um sorriso. Ele tentou começar a falar mas ela lhe interrompeu antes de começar.
- Se tu estava tentando me cantar, sendo mais objetivo, pode crer que não vai rolar dessa forma. Que absurdo, to quase sem fome.
- Er... é, eu não quis, bom pois é, não devia ter contado, em seguida te trago a alaminuta.
- Tô brincando, te peguei hein! - Ela finalmente sorri, e aquele nó da barriga se desfaz aos poucos.
- Uh, bah, é que sei lá, nem te conheço direito.
- É, e já sai contando essas coisas. Sério, seja mais discreto.
- Tudo bem, tenho que ir, em seguida te trago o prato.
- Aha.

Não demorou e o prato já estava na janela de serviço da cozinha. Ele se apurou, pediu-lhe licença e montou a mesa. De longe observava-a comendo, delicada, foi comendo devagar, mastigando bastante, juntando salada com comida, misturando as carnes. O suco foi justo, ao terminar o prato estava quase no fim do suco, ele fez o seu trabalho e aproximou-se para retirar o prato.

- Com licença.
- Claro.

Retirou as coisas da mesa, esperou até ela terminar o suco que estava justamente tomando. Ao terminar indagou.

- Outro?
- Não obrigado, estou satisfeita, estava ótimo. Gostei do molho.
- Ah, o molho, ehhehehe, tem um segredo que o torna delicioso.
- E tu não pode contar, imagino...
- Na verdade não, mas se tu aceitar sair comigo eu posso pensar.
- Que?
- É, poderíamos tomar alguma coisa de noite, que tal? Eu não tenho o turno amanhã, se tu estiver afim... o que tu acha?
- Tu vai contar do tal molho?
- Eu conto, vamos no Mr. Pool, que tal?
- Tá, aceito, que horas tu sai?
- Termino meu turno as cinco, mas poderia ser tipo umas oito, pra dar tempo de fazer uns trâmites que tenho pra fazer no centro, tem problema ou prefere mais cedo?
- Não, tudo bem, pode ser. As oito aqui?
- Beleza, estamos combinados.

Ele levou as coisas da mesa para a cozinha, voltou e a viu pagando a conta no caixa. Aproximou-se.

- Bueno guria, então até amanhã.
- Até, bom trabalho.

Se beijaram no rosto com educação, o caixa ficou de bico e foi obrigado a comentar em seguida.

- Então, trabalhando pouco hein.
- Hehehhe, a gente faz o possível. - Era clara a felicidade naquele sorriso depois da frase, ele tentou esconder mas não se aguentou.

segunda-feira, fevereiro 11

Adeus

Não acordou cedo por que não dormiu, foi outra noite pensando na sua mulher, a confusão entre lembrar a dor de enterra-la e a saudade dos seus momentos juntos. Levantou, alisou a cabeça e olhou-se no espelho. Olhos vermelhos, cara de destruído, acabado. Fazia sentido. Não escovou os dentes, apenas lavou o rosto e voltou pra cama. Lhe doeu novamente olhar a cama de casal arrumada do lado dela. O direito.
Cigarro aceso e chinelo nos pés, foi se arrastando pela casa pensando no que estava prestes a fazer. Na sala meio indeciso chegou próximo daquele móvel que ela insistia que se chamava aparador e ele chamava de penteadeira, apoiado numa ponta por um porta-retrato deles um pequeno papel dobrado com certo número de telefone.
Trêmulo ele pegou o celular e se pôs no sofá. Não, seria muito estúpido, olhou a tela com fundo negro e pensou que ao menos no celular ele não costumava manter tanto aquelas coisas melosas de casal. O vazio negro da tela o deixou respirar.
Largou o celular e vestiu uma bermuda por cima da cueca. A primeira camisa que encontrou no roupeiro e o papel direto para o bolso da camisa. Nunca usava orelhão, precisava comprar cartão e finalmente buscar algum por arredores.

Chamando.
- Alô?
- Alô.
- Amm.... Sobre a.... a 35, ainda está, está disponível? - Sua vóz era trêmula e ele não conseguia acreditar no que estava fazendo.
- Podcrê, ta afim mano?
- É, amm... Sim... Eu quero comprar.
- Velho, redença perto dos banheiros as três.
- Tá. Eu estarei... lá.
Tuuu tuuu tuuu...

Ele olhou para o telefone em sua mão, olhou para os riscos e números de puta e táxi colados por dentro da cabine telefônica, trêmulo colocou de volta no gancho. Ia saindo e o telefone fez uma espécie de bip bastante alto e umas tantas vezes. Havia se esquecido do cartão, suor na testa. Foi para casa.
O mínimo trajeto o deixava cada vez mais triste. Passou na frente da ferragem onde comprou tantas vezes buchas e brocas para pendurar os quadros que ela queria, passou na padaria e poderia sentir no cheiro do pão o perfume dela mesclado, mesmo nas vezes em que ele ficava na fila lendo o jornal. A cidade era ela.

O dia foi lento, não decidiu nada sobre o almoço só ficou sentado na sala com tudo desligado. Olhava o relógio e ficava cada vez mais tenso. A cada cigarro, cada tragada o sufocava de uma forma desumana. A hora chegava, ele deveria se preparar para buscar a encomenda.
Levantou-se do sofá, deixou o cigarro por cima do cinzeiro lotado de bitucas, buscou caneta e papel. Papel foi mais complicado do que imaginava, não havia muito e lembrou do caderno de receitas que a mulher usava. Não sabiam cozinhar nada, e só de piada ele escreveu como primeira receita o ovo frito que ela fazia seguidamente. Agora a última página era escrita na mesinha de centro, entre lágrimas e cigarro. Sua receita de morte.

Buscou os bancos mais próximos do banheiro, andou um pouco, não encontrou ninguém suspeito. Nada. Sentou-se num banco próximo com vista para os banheiros. Fumou um cigarro, já era três e dez quando sentiu um toque no ombro. Quase levantou, assustado tentou olhar para trás mas o sujeito já estava sentando-se ao seu lado.

- E aí?
- Oi.
- Aqui, aqui está tudo.
- Calma velho, deixa o cara ali passar.
- Ah, ah ta.
- Tá, aqui. - O sujeito tomou o envelope da mão dele, abriu e inspecionou as notas, uma contagem rápida.
- Beleza. - Lhe passava um pacote de pão amassada, ele tomou-a nas mãos e sentiu seu peso e rigidez, o formato do revolver era claro ao tocar o pacote. Colocou no bolso da bermuda jeans, o desconhecido já se distanciava tranquilo. Ele, tenso, sentia o sangue pulsando na mão enquanto tocava o pacote.

Dirigiu-se para casa suspeitando de todos, cada policial que via na rua olhava para o chão, com a certeza de que sabiam que estava fazendo algo, ele sabia que eles sabiam. O chão acompanhou seus olhos até chegar em casa.
Deixou o pacote na mesa de centro, acendeu outro cigarro e finalmente foi revisar o conteúdo. Revolver calibre 35, carregado. Taurus. O peso na mão, ferro gelado. Tinha procurado na internet aonde estava a trava de segurança e a encontrou. Trocou de posição uma vez, outra. Deixou de volta no pacote. Os cigarros haviam acabado ele pensou consigo mesmo e seria a hora. Lutava com a vontade, mas era dominado, não tinha saída, estava decidido, estava com medo.

- Pelo menos mais um cigarro.

Foi pra rua como havia saído antes, chinelos e nesse caso, trêmulo, fome, angustia o corroíam. Comprou cigarro na esquina, não havia Camel, comprou Marlboro. Acendeu e foi em direção a casa. Passou na frente de um bar e decidiu que poderia tomar uma ultima cerveja. Estava tenso e quem sabe um pouco de álcool o ajudaria, era econômico nesse sentido e não havia comido o dia todo. Tomou sua cerveja com calma enquanto fumava desesperadamente. Evitou qualquer contato humano e se foi para casa. Chegava a hora.

As lagrimas escorriam pelos seus olhos, e com os dentes serrados numa mescla de raiva e angustia, tomou fôlego e colocou a arma na boca, sentiu o gelado nos lábios, o ranger do aço em seus dentes. Um gosto de sujeira o fez quase vomitar, se recompôs. Tirou o revolver da boca, gritou sozinho em casa. As lágrimas escorreram, ele olhou um quadro do casal próximo a televisão. Confirmou finalmente a trava de segurança, ele não sabia mais o que sentir. Levantou-se diante do sofá, estava precisando se firmar, mas antes mesmo de tentar desistir em uma sequencia de movimentos rápido, arma na boca, fechou os olhos e click.
O silêncio reinou logo após o estalo.

Última

Ele não era um bêbado, nem vivia drogado. Tratava-se de um cara normal, dentista, com mulher e pensando em ter filhos. Seus trinta e poucos anos chegavam aos olhos de algumas pacientes como se fosse vinte e oito e aos olhos de sua mulher como um problema de ciume constante.
Passava o dia na clinica e chegava em casa normalmente tarde, por volta das oito, a mulher o recebia com aquele beijo de comida quase pronta, ele a olhava todos os dias e quieto pensava o quando precisava dela. Na realidade gostava de se cuidar só para provocar ciumes. Também acontecia com ele quando ela ia pra faculdade de vestido, mesmo que comportado ele tinha certeza de que seus alunos a olhavam de forma diferente.

- Já fui aluno e lembro bem o que passava por nossas cabeças com uma professora assim.
- Tu sabe que sou só tua, bobo. - Tapa na bunda dele.
- Eu sei. Bom trabalho.

Cada um no seu rumo diário, e eventualmente alguns almoços juntos. Era certo que no minimo um almoço na semana, e aquelas jantinhas fora de casa com cinema ou qualquer coisa que se possa fazer juntos.
A coisa toda só mudou depois de umas altas e baixas de verão, quando ela ficou gripada. Era febre, e tosse.  Foi tratado como gripe durante alguns dias. Ela dizia que melhoraria, ele se irritava por ela não querer ir no medico, mas respeitou sua decisão.
Foi quando ela tossiu sangue que finalmente descobriram no hospital que se tratava de uma meningite tuberculosa. A pergunta do è grave foi respondida deixando claro que foi um erro deixar passar tanto tempo para ir ao médico.
Foram vários meses de tratamento com uma média de quatro drogas diárias. Dinheiro não era problema e o tratamento seguiu até que ela deixou de tomar os remédios por conta. Sentia-se bem a algum tempo e não via por que seguir tomando tanto remédio, principalmente pelo nojo que tinha dos comprimidos. Todos os dias lhe cansava e se sentia velha.
Passado alguns meses ela retorna com mesmo problema. Meningite tuberculosa. Ela não havia se curado e as bactérias desenvolveram resistência aos medicamentos. Ele a acompanhou no hospital todos os dias durante o tempo que pode. Tinha ciumes quando vinham enfermeiros atende-la, mesmo que não fosse o mesmo fetiche masculino.
Depois, em estado final ele deixou o trabalho e passava ao lado dela, lia, conversava, atualizava o face. Assim permaneceu, até o fim. Ele com seus trinta e tantos vendo sua jovem mulher morrer no hospital. Foi forte, ele fora mulherengo quando jovem mas depois dela as coisas haviam mudado. A família ajudou no que pode durante o processo, os pais de cada um visitavam, os dela, principalmente, mas quem nunca saia do quarto era ele. Chegou a brincar de pedir um pinico pra não precisar nem defecar fora do quarto.
Ela faleceu e a casa ficou cheia de memórias. Ele largou o emprego e foi pro bar.

--

- Boa tarde, em que posso ajudar?
- Uma última cerveja por favor.
- Temos uma artesanal chamada República, muito boa.
- Pode ser.

Ele estranhou o pedido, levou a caneca loira com dois dedos de espuma. O homem fumava um Camel sem parar, mas bebia com calma, realmente parecia apreciar a cerveja. Não pediu a conta, deixou dinheiro em cima da mesa e se foi. Ele correu para mesa para garantir que não foram roubados mas a nota de cinquenta acalmou de imediato.

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Ele se surpreendeu quando um colega o chamou para ver a noticia no jornal. Reconheceu o a foto do homem que havia pedido cerveja no dia anterior. Cometera suicídio em casa usando uma 35. Típica notícia, os vizinhos ouviram um único disparo e chamaram a polícia que perceberam o corpo no chão da sala olhando pela janela, uma carta foi deixada para a família e nenhuma outra informação fora revelada, apenas seu nome: Ricardo Brandão de Moura
Sempre fora cético em relação a suicídios, pra ele era uma forma de chamar a atenção.

- Pelo menos esse conseguiu, nada pior que um merda tentar se suicidar e falhar nisso.

Os colegas não sabiam o que dizer e ele continuou.

- Claro, a ultima cerveja.

sexta-feira, fevereiro 1

Clássica

- E pra você?
- Ahmmm... Uma cerveja e o que tu poderia sugerir pra comer?
- Primeiro, qual cerveja? Bohemia? - Um rápido aseno de cabeça confirma o pedido.
- Pra comer tipo comida ou pra dar uma beliscada? For comida temos o prato do dia...
- Não não, pra beliscar mesmo.
- Nesse caso acho que um picadinho, não é caro e vem a calhar, que tal?
- Pode ser, mas vou querer desconto se não for tudo isso!
- Hahah, pode deixar. Tenho certeza que vai gostar.

Ele saiu e fez seu trabalho. O fim de tarde veio morno no porto e os pedidos de cerveja aumentaram conforme a noite surgiu. a musica ficou mais alta e a decoração do bar pareceu mudar com a iluminação. Luzes fracas por dentro e pequenos focos na parte de fora do bar, por baixo dos guarda-sois que agora guardavam a lua.

Aquela mesa era de uma só garota, ficou lendo um livro por ali, pediu umas três cervejas que tomou lentamente e sozinha. bonito de ver, uma morena assim. Era meio gordinha na realidade, mas tinha um corpo bem formado, ancas largas e coxas volumosas davam contraste com uma cintura que não parecia ser dela. Esguia na altura do umbigo, mesmo tendo uma barriguinha pra frente, a cintura por fim era pequena, deixando um corpo de violaocelo bem desenhado.

- Adoro musica clássica.
- Que? - Uma expressão de completo desentendimento foi o principio de um momento bem estranho.
- Ah?
- O que disse?
- Nada.
- Ah, ta...

Não entendeu a tal da musica clássica, mas de toda forma ele ficou sem jeito e teve que sumir. Só voltou quando pediu conta.

- Aqui esta.
- Certo...

Revirou sua bolsa por uns instantes e tirou umas notas. Contou uns trocados e deixou quase o valor da conta. Ele já ia calculando conforme ela desenbolsava o dinheiro e notou que ficou dois pilas a mais.

- Te sobram dois pila.
- Ah sim, foi de proposito. eu também gosto de musica clássica.
- Que?
- Tudo certo que gosto, só falar isso do nada é bem estranho, tu devia te tratar.

Ele ficou naquele sorriso amarelo parado com a mão em direção a tabuinha de conta com a nota. Ela se ajeitou e levantou enquanto ele se recompunha e recontava o dinheiro.

- No fim eu adorei o picadinho, obrigado.
- Ah, de nada. E como se chama?
- Muriel, e tu?
- Cezar, prazer. - se inclinaram e trocaram beijos de bochecha.
- Um prazer, Cezar, nos vemos. - Ela juntou sua bolsa e o livro levou no colo, estilo colegial.
- Tchau, até mais.

Fez o seu trabalho, organizou a mesa, limpou tudo e deixou o cinzeiro. Acendeu aquele cigarro merecido depois de umas horas de trabalho e pensou pra fora.

- Muriel, puta que nome feio.

domingo, janeiro 27

Encontro no mercado

O cara saiu de casa para outro dia de trabalho. Garçom naquela tal cidade, era simples o trabalho mas relativamente puxado. Aconteceu de conhecer uma certa garota no outro dia quando voltava a pé. Era por volta das cinco da manha e ela estava meio que perdida. Invariavelmente bêbada e louca.

- Tu ta bem guria?
- Que que e?
- Pergunto se esta bem.
- Estou ótima.

Ele deu mais uns passos na direcao oposta e parou em seguida para olhar sua reação. Ela estática olhava para as esquinas da rua buscando os nomes das ruas nas placas. Foi inútil, placas velhas de mais já gastas.

- Pra onde tu quer ir hein? Deixa de ser besta.
- Não me incomoda, eu sei pra onde estou indo.

Ela segue pra atravessar a rua e justo passa um taxi buzinando fazendo ela dar uma volta toda torta e desnorteada.

- Que cena de filme, agora deixa de ser besta e me diz pra onde que eu te ajudo, não sou drogado nem estou bêbado. Não ainda.
- Era pro mercado, eu lembro que ficava perto do mercado.
- E fácil, só descer essa rua ate o fim e na ultima sinaleira tu pega a direita. Em seguida tu se depara com o mercado.
- A ta, valeu.
- Beleza, boa sorte e te cuida guria.

Ele nem chegou próximo dela, estava muito acuado pra qualquer aproximação. Acabou indo na direcao indicada mas não demorou nada pra tropeçar no salto. Aquela loira magra estava em queda quase livre ate o chão, felizmente conseguiu colocar as mãos e sua pequena jaqueta de couro ajudou a proteger os bracos quando depois de ralar as mãos caiu de lado na rua. Ele correu ate ela rindo.

- Hahhahaha, mas então ta ne, não precisa de ajuda.
- Para, não ri de mim.
- Heheh, ta bom, vou me puxar. - Levantando a do chão.- Tudo bem?
- To legal, to bem.

Ela visualiza sua meia calca rasgada e da um resmungo de raiva leve.

- Vamos la, te acompanho.
- Nem pensar. Obrigado pela ajuda mas pode deixar que eu me viro sozinha. Só estou um pouco tonta.
- To vendo. Mas não acredito que esteja bem, deixa eu te acompanhar.
- Nada disso guri, pode te mandar pra casa, tua mãe te espera.

Notavelmente ela era mais velha. Maneira de se portar por mais borracha que estivesse ainda mantinha um certo estilo e educação.

- Me deixa te ajudar guria, não tenho nada pra fazer ate as quatro da tarde de amanha. Moro aqui perto e não me custa nada te guiar ate la.
- Ah, para.
- Não, serio, não custa nada. Deixa de ser besta.
- Ta, ta bom. Mas nem vem que não to afim de rolinho nem nada.
- Eu saquei de cara, não te preocupa.

Ele acompanhou a garota, ela seguiu tranquila e ate certo ponto começou a se sentir de verdade segura com ele. Começou a confiar na sua presença. Ele apenas foi gentil e tentou mantela em pé e na direçao correta sem perder muito o rumo. Não tentou nada, não fez nada de mais. Apenas caminhou ao lado dela. Foram bons minutos para cada um. Ela estava bêbada, mas a agua que ele encheu o saco dela pra que bebesse ajudou a recobrar os sentidos.
 Foram quadras e quadras e papos e papos. Uns bestas uns interessantes. Afinal eles não estavam tao perto assim, ele sabia e por isso queria garantir a segurança. Era ela linda. Ele gostou logo de cara da garota. Fazer o que. Acontece. Ela se mantinha distante, mas estava aos poucos caindo na rede. Mesmo mais experiente, queria ser pescada.
Nenhum beijo nem toque aconteceu naquele dia. Ele finalmente foi se despedir dela. Já haviam carros pelas ruas, disseram tchau e nem pediram por seus nomes, apenas disseram tchau.

- Tchau guria, quem sabe nos vemos um outro dia.
- Que? Eu pensando que era um rapaz de bem e tu me vem com essa. Não precisava.
- Não, que isso, só quis dizer que quem sabe um dia... ah, esquece.
- To brincando, quem sabe amanha no mercado?
- Beleza.
- Então ta.

Ele se distanciou dela, deixando a na frente do prédio da tal amiga que ela veio falando. Era pra passar a noite e ela acabou saindo pra tomar umas corujas e deu no que deu.
Já meio distantes ele lembrou que não haviam combinado horário. Gritou quando ela estava entrando pela portaria.

- As duas!
- Beleza!
O grito deu a certeza de que daria certo, entretanto ela entra e comenta com sua amiga
- Quem era o cara?
- Um maluco que conheci na rua, agora, me ajudou a te achar. Bem querido, realmente quero velo amanha.
- Ah sim, ele combinou contigo então?
- Aha, amanha as doze no mercado.

Ambos buscaram por mais de hora por todo o mercado, cada um tomou ate uma cerveja sozinho na esperança de encontrar o outro. Ele ainda acendeu um ultimo cigarro antes de ir embora, olhou a fumaça indo pelo ar durante a tarde. A noite foi incrível, e incrível foi o desencontro.

terça-feira, janeiro 22

Cuzqueña

Já chego escrevendo do segundo hostel da mesma marca, wild rovers. Lugar bom, chegamos em cusco ontem por volta das seis da manha. Tivemos que esperar ate as duas da tarde pra conseguir lugar no quarto. Sem problema, quer dizer, ficamos na sala de tv olhando batman, dois e tres. Nao tinha olhado eles ainda, então beleza.
Gurizada dormiu bastante por ali, eu não consegui. Acabei olhando os filmes mesmo, estava podre de cansado da viagem de onibus, que mesmo que o lugar fosse confortavel e nao houvesse nenhum cheiro de nada bizarro, ainda assim nao era suficiente pra eu relaxar e dormir tranquilo.
Nem conhecemos a cidade nem nada, soh descobrimos aonde ir pra fazer a carteira de estudante internacional e aonde poderiamos ver negocio de turismo pra fazer a viagem pra machupichu e mais uns lagares bacanas com nomes meio estranhos.
Quando chegamos era aquele belo sol, quente mesmo, nao dava pra ficar fora da sombra. Alegria, vamos longe com sol! Que nada, durante a tarde caiu aquela agua toda. De balde. Compramos uns ponchos e em seguida umas calças impermeaveis. Tudo certo para mais chuva.
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Mais pingpong. Estou menos pior. Agora com luz durante a noite nos permitiu jogar até mais tarde. A mesa de sinuca é menor e fica dentro do bar, então ainda não provamos, visto que não ficamos muito lá dentro, sempre pegamos a cerveja e ficamos pelo pátio central.

A noite no hostel foi mais calma que a do anterior, onde faziam loucuras na mesa, gente louca, barmans podres de bebados e todos gringos. Agora foi sereno, um pubzin, uma coisa bem mais tranquila e polida. Praticamente nossa mesa era a única que farreava mais, gritava e ria mais alto, ao menos foi minha impressão olhando de dentro do círculo.

Acho que bebemos até umas tres no bar, os guris ainda foram pra boate Mama África depois, eu tomei mais uma no sereno e fui dormir, estava podre. De novo aquela coisa, eles conseguiram dormir no onibus e durante a manhã, eu não. Nada melhor que um bom sono pouco antes do limite da beberragem
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Os peruanos, como poderia dizer. Mais que nada são indios. Em geral sao boa gente, infelizmente nos veem como dinheiro ambulante, o que acaba trazendo sempre gente pra perto pra oferecer qualquer coisa. É um saco ficar repetindo que não com educação.
São muito mais índios que os chilenos, pele mais escura e aquele formato de rosto bem índio, queixo largo nas laterais, cabelos lisos oleosos e pretos, pele lisa até certa idade e depois rugas bem definidas.
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A parte chata é a comida. Aquela história de passar com dor de barriga a viagem inteira até que não era tão mentira assim. Até agora tem sido bem complicado manter a consistencia do barro. Coisa chata essa comida ser gostosa e causar tantos problemas internos. De verdade, comida tri boa, muito mas muito temperada e bem banhosa, cheia de batata, arroz, carne, cebola, tomate, enfim. Falar em comer, já estamos saindo pra almoçar, em seguida devemos conhecer um pouco da cidade.
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Estou com dificuldades pra conhecer o peru, não estou exatamente conhecendo, quer dizer, me sinto como apenas "passando por". São fotos, poses e tal, mas não sei se conhecemos. Vou ver se conheço um pouco mais hoje a noite, pretendo sair do hostel e se ninguém vier junto, vou procurar um bar local ou algo assim, um meio termo em questão de tudo e preferencialmente com uma cerveja barata.

sábado, janeiro 19

Cinco

O caminhão com as novas mesas do restaurante havia chegado. Eram cadeiras de madeira simples, provavelmente daquele tipo reflorestado, uma aparência meio frágil misturada com tom de nova recém fabricada. As mesas passavam a mesma impressão formando um belo conjunto.
Ele ajudou a descarregar, era só um garçom, mas seja como for, trabalho é trabalho e não gostava de coçar o saco enquanto outros se esforçavam. Foi de pilhas em pilhas e finalmente retiraram todas as cadeiras. Agora faltavam as mesas. Foi uma, uma das frágeis emperrou, o imbecil que havia começado a pouco tempo acabou forçando e arrancou ou desmontou uma das pernas da mesa. Chefe gritando, e porque isso e aquilo mas no fim retiraram tudo.
Ele ficou no caminhão vendo se faltava alguma coisa e no fim do container encontrou uma espécie de barra de aço fina. Sólida. Era de mais ou menos um metro e havia uma mancha na ponta, misturada com sujeira. Tomou a barra nas mãos e imaginou que poderia ser da estrutura de alguma mesa, quando virou para perguntar, o motorista apareceu, quase que como uma sombra atrás dele já em cima, interessado no assunto.
- Opa! Posso te ajudar?
- Não, sim, quer dizer, acho que faltava só essa.
- Ah não, é que essa eu venho trazendo. É minha.
- Ah bom, sem problemas.
Passou a barra de aço nas mãos do homem e o mesmo limpou a ponta, devolvendo-a ao local inicial, um entremeio da estrutura de madeira que faz parte do interior da caixa do caminhão.

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Rodar pela estrada era como fazer o sangue circular pelas veias. A vida de caminhoneiro era muitas vezes complicada e a solidão o fazia pensar de tempos em tempos. Pensar diferente.

Foi andando pela RS 239 ali pela altura de Parobé a Taquara que ele viu um rapaz vendendo melancias na estrada. Era final de tarde e o cara que vendia estava se preparando para partir já colocando o pouco que restou na carroça atrás dele.
- Opa, ainda tem melancia?
- Sim, claro, te faço por cinco pila, tão boa.
- Cinco... ta certo, será cinco. Aquela ali.
O rapaz deuse volta para buscar a fruta indicada pelo homem e quase de imediato sentiu sua cabeça pesada. Foi um golpo preciso em sua nuca com uma barra de aço relativamente fina. Primeiro de joelhos, em seguida aparagam-se as luzes.
Não sabia bem aonde estava, mas a dor era quase insuportável em seu pescoço. Não estava amarrado, mas era escuro o suficiente para não ser necessário esse tipo de precaução. Asustado com a situação, num terror alucinante se colocou de pé o mais rápido que podia mas não foi suficiente.
Os olhos ainda sem enxergar nada e veio o primeiro golpe. Direto na coxa direita, uma dor absurda, ele tentando encontrar alguma coisa pra se agarrar numa briga e nada. Os três seguintes foram em qualquer lado, louco no escuro se movia como podia mas a barra de aço era suficiente pra quase quebrar seus braços e seu peito. Foram uma sequência dolorida, um na altura do estômago que provavelmente trincou uma costela, em seguida vindo pelo outro lado, tentando se defender de qualquer forma, o braço direito atingido meio torto. Muita dor. o outro lado, na altura da cabeça, trincando um dos ossos no braço.
O homem bufava parado pronto para mais uma. O rapaz gemia de dor e se colocava de joelhos implorando por sua vida como podia, entre lágrimas e qualquer coisa que tentasse expressar.
Sem escutar nada, o homem desferiu o número cinco dos golpes, direto na cabeça, fazendo a barra de aço entrar alguns centímetros na cabeça do rapaz.
Um cheiro de sangue no ar junto com os típicos insetos da região, o homem estava bufando. Firme com a mão da barra de aço. Parado estático diminuindo sua respiração pouco a pouco.
De longe se via as luzes dos carros passando na RS, o homem suspirou e acendeu um cigarro.
O sangue voltou a fluir junto com as rodas.

Wild Rovers

Não sei exatamente porque o nome assim, e mais ainda porque diabos o lugar é irlandes, mas parece que é. Dizem. Toca músicas irlandesas nos happy hours e tem bandeiras da irlanda por ai. O lugar é uma tipica casa antiga da cidade, com dois espaços internos que se poderia chamar de jardim. Nesse caso é puro piso e no outro lado uma pscina, mas seja como for eu me embalo a essa hora com Dire Straits, depois de ter deixado a farra super cedo e só conversado com uns extrangeiros.

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did the walk
he did the walk of life
yeah

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Achei um pessoal metido a escritor ou poeta e nós somos todos iguais. Está ficando complicado de conhecer peruanos, é mais fácil conhecer extrangeiros por aqui, andam todos pelas mesmas bandas e bueno, muitas histórias são semelhantes. Vejo muita gente da europa e descubro que pra eles é barbada fazer esse tipo de viagem. Pobres de nós, latino americanos. Antes de mais nada já agradeço de antemão pela oportunidade que o querido primo me deu, da experiência e tal, é um troço que eu sempre quis ver e bah, era pior do que eu imaginava em alguns aspectos.
Meu professor de desenvolvimento humano e profissional está cada vez mais certo. Ladeira a baixo e o toco de madeira que era freio já está gasto.

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O dia foi praticamente curtir o hostel, ficamos jogando ping-pong quase toda a tarde. Cervejas e falando asneiras. Também teve alguns papos mais cabeça, como toda conversa de bar deve ter, e bueno. Foi Legal. A coisa toda. Poderia buscar mais detalhes e cousas mais que contar mas hoje foi realmente simples. Ah, pra comemorar, primeiro dia de dor de barriga. Me avisaram que isso aconteceria durante toda a viagem. Alegria que um dos bruxos está se formando em medicina e nos comprou uma farmácia inteira. É até estranho não se automedicar com base nas propagandas da tv.

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Amanhã devemos conhecer de verdade mais da cidade do que o pouco que caminhamos hoje durante o almoço. Seja como for, o banho que tomei durante a manhã foi um dos melhores da vida. Realmente estava podre, uma água quente rejuvenesce. Talvez até tome um agora...

sexta-feira, janeiro 18

Chile a Peru

Comecou como eu nunca imaginei que iria comecar.
O dia foi tumultuado e cheio de novidades, com carro batido de um amigo que já iria virar negocio pra fazer mais uns pilas por nada. Aconteceu de "perdemos" tempo por um par de coisas e enfim, o dia realmente correu. Foi barris, foi tanques de CO2 e mais umas idas ao centro além de cortar o cabelo num lugar que nunca tinha ido antes.
O negócio de cortar o carbelo foi bacana, realmente precisava, poderia ter deixado mais apresentavel, mas resolvi que seria melhor quase rapar de uma vez. Ficou bem curto num nivel que se quer me agrada.
Nos encontramos com o pessoal da viagem pra chegar em casa primeiro e buscar a mochila, acabamos bastante atrasados, sequer tomamos banho. Só nos vestimos e já saimos de casa. Foi realmente rápido, quando me dei conta ja estava rindo com os caras no quarto de casa e ajustando os ultimos detalhes da mochila.
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O aeroporto foi sereno e relativamente rapido, sem problemas nem nada do genero. Só entramos no aviao, ansiosos e logo chegamos em arica. Pra variar, meu acento ficava do lado de duas velhotas e gordas. Sim velhas e gordas. Que tristeza. Bueno, troquei de lugar pra um outro lugar onde nao podia ajustar a poltrona, e acabei ficando com as paletas duras por mais ou menos duas horas de viagem.
A chegada em arica comecou com pequenas duvidas de onde iriamos, tinhamos dois destinos, nao sei exatamente quais, mas sei que eram dois. Acabamos optando por um deles e pelo que vivimos depois posso dizer que foi o melhor que poderiamos ter escolhido.
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Conhecemos a familia da garota, uma gordinha simpatica, que aparentemente era amiga do seba. Foi de taxi que chegamos na casa dela, coisa relativamente rapida. Do aeroporto ate a casa da moca. Tudo certo. Ali fomos muito bem recebidos pelas duas irmas dela e seu pai. Contamos um pouco de cada um ate que partimos para praia.
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Puta merda, que sonho. Eu sempre quis beber e fazer fogueira na praia pra cantar com violoes e vibrar so sentindo o fresquinho da noite. A cerveja era pouca e acabamos tomando tudo muito rapido, nao foi muito problema conseguir uns piscos e umas coca colas. Questao de quarenta minutos. Muita gente, estranhos, esrtangeiros, todos animados, embalados em maresia, cantando, conversando. Foi genial, simplesmente genial. Depois que tirei os tenis realmente fiquei tranquilo, era como se finalmente tivesse com os pes no chao. Era verdade, os pes estavam, minha cabeca que comecou a ir para as nuvens depois de escutar alguns temas conhecidos.
Meu apice foi quando escutei hotel california. Lembrei dos bruxos, dos bares, das noites, dos amigos bebendo. Puta que saudade de todos voces. Foi incrivel passar por isso, cantar alto com o pessoal que tambem de tao bebado tinha esquecido da letra. Bueno, seja como for. Fomos.
A noite terminou com quatro malucos dividos entre uma cama de casal e uma de solteiro.
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Acordei por ultimo, so pra variar e fui tomar um banho. Pra economizar toalha acabei sequando só um pouco e com papel higienico. Nao queria gastar nada de roupa ainda, nao, nao ainda. Tudo certo. Cafe da manha era pao quente com algumas coisas. Alegria. Comemos e aprendemos um pouco sobre o que nos esperava em peru. Seguimos viagem em seguida.
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O taxi que nos levava ate o peru era no minimo engracado. Aqueles carros grandes tipo escolta de presidente, que tem tres lugares na frente e os tipicos tres lugares atras. Foi tranquilo. A cidade uma droga. Muitas casas por terminar, muita gente feia. Passamos na aduana praticamente sem ser revistados. Eles ate tinham aquela maquina de raio xis, mas o cara que cuidava estava tao ocupado olhando a bunda de uma guria que acabamos passando despercebidos.
Muito deserto pela frente. Era terra, e mais terra. Muito po e muita pedra. So isso nos esperava. Chegamos em Tacna e realmente, a parte mais bonita eram os jardins que foram provavelmente fabricados a base de alguns rigamentos artificiais e coisas do tipo. O resto era himundo e feio.
Do terminal de taxi acabamos indo direto para o terminal de onibus. onde ali, que maravilha, nos fereciam drogas como se fosse qualquer coisa. Foi no minimo engracado dizer que nao queriamos maconha a cada dois passos que davamos.
Bueno, pegamos o onibus e uma viagem de mais ou menos seis horas nos esperava.
Maravilha de onibus, um troco velho fedendo a mijo e porra. Literalmente e sem exagero. Nos sentamos nos ultimos acentos do onibus, que por acaso era justamente os que tinham disponiveis quando compramos a passagem, pronto, o mijo era do banheiro ao nosso lado e os ultimos acentos realmente fediam a porra. Sim porra mesmo, tipo sexo feito a pouco tempo por ali e escorrido pelas coxas dos indios envolvidos nesse troco, acabou que ficamos ali mesmo, por seis horas. Acho que o juan acabou dormindo a maioria do tempo, mas nos sofremos, no minimo um pouco.
Janela aberta e fedor batendo. Que beleza.
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Chegamos em Arequipa e ja foram oferecendo taxi pra todo que é lado, incrivel. Conseguimos encontrar o hostal que queriamos e puta merda, que alegria. Pensei que seria um monte de merda cheia de gente fedorenta e qualquer coisa assim. O melhor engano da vida. Muita gente de todos os lados. India, Peru, Bolivia, Chile, Brasil, Franca, Enfim, tudo que eu pudesse lembrar. Aconteceu de que a noite soh deixamos as mochilas no quarto e ja saimos pra comer. Comida por mais ou menos quatro pilas ou tres e pouco, uma sopa pra comecar e depois o tal prato principal acompanhado de cha. Incrivel de barato e morremos de medo por ficar podres da barriga.
Puta merda, que hostel incrivel. Tinha uma sala de jogos com flaflu e sinuca liberada e um pubzinho do lado. Perfeito, jogamos muito, bebemos muito. A noite foi perfeita como bons cavalheiros. Um pessoal novo aqui falando espanhol, outro la falando ingles. Caralho que maravilha.
A noite foi ate mais ou menos quatro da manha, lembrando que ganhamos duas horas entre chile e peru. Nossa, minhas paletas podres mas puta que estava divertido. Acabamos ate nao sei que hora, mais ou menos agora quando lhes escrevo ainda meio bebado e louco. Na verdade estava quaser terminando quando um pessoal me chamou pra conversar. Terminei na manha seguinte, bem rapido, ainda temos um bom dia pela frente, ja de banho tomado e pronto para as aventuras do dia, acho que vamos pela cidade mesmo, pois amanha nos vamos de viagem. Seja como for, caralho que gente afude, quanta cerveja e sinuca. Os caras, as gurias, musica. Logo eu continuo, boa viagem a todos.

domingo, janeiro 13

Terceiro dia

A ideia inicial daquela noite era se arrumar todo durante a noite pra sair rápido no dia seguinte. Celular despertou por volta das seis da manhã, naturalmente desliguei o despertador inconscientemente e acabei dormindo até umas oito. Apavorado pra sair fechei a mochila e juntei tudo o que podia pra ir direto tomar café e já sair correndo pra estrada. Qual minha surpresa ao ver o nível de café da manhã do tal hotel. Triste. O croissant frio que me serviram devia ter uma semana, ficou ali como peso para o prato não voar. Tomei literalmente só café, café e mais um café e só.
Saí de Paraná meio sonso parando numa Shell na saída da cidade pra garantir que fosse até Federal, eram por volta de 186km, segundo as placas, bom, segui em frente mantendo uma média de 120 km/h, era o apuro pra chegar. Até então em toda a viagem dentro da argentina passei por diversos postos de polícia e nenhum havia me parado. Segui tranquilo até uns 60km de Federal me pararam. Andava sem seguro, estava consciente, mas como ninguém me parou na aduana, achei que pudesse passar tranquilo. Pior erro.
Mostrei todos os documentos e ele pediu claramente o seguro. Não tenho seguro, me disseram que poderia passar pois não era possível fazer seguro no chile, era um argentino com uma moto chilena, então não tinha seguradora e blablabla. Não funcionou, só piorou. Veio ele com história de como é importante ter seguro e completando teria de pagar uma multa de 140 dólares. Alegria. Pensei, pronto me fudi, vou ter que pagar o troço ou o que, direto pros caras. Dito e feito, coisa que normalmente não se faz, é pagar diretamente aos policiais, pois foi assim, tentei enrolar dizer que tinha justo pra gasolina e poderia ficar empenhado. Problema teu. Acabei pagando com reais, pesos chilenos, argentinos e dólares. No final, ainda além de pagar diretamente ao posto policial passei parte do dinheiro dobrado, o cara entregou ao colega que foi até um quarto do posto e voltou dizendo que faltava por volta de 50 dólares mais. Eu tinha certeza do quanto havia, mas tudo bem. Paguei o resto e saí de lá ainda dizendo feliz natal aos canalhas.
O caminho até Federal foi cheio de raiva e nojo. Voei a quase 140 km/h o limite da moto, estava pronto pra matar policiais. De qualquer forma devia procurar uma seguradora na argentina pra garantir não ter o mesmo problema no brasil ou até mesmo na volta. Bueno, fui raivoso até onde pude, não parei em nenhum posto de gasolina, queria chegar mais rápido ainda, a brincadeira com os policiais demorou por volta de uma hora ou mais então devia correr. Esqueci-me da infeliz limitação da moto, de uns 200 km de autonomia. Resultado foi que quando vi placas que dizia alguns quilômetros pra Federal a moto começou a falhar. Acionei a reserva e ela seguiu afogando e afogando e diminuindo cada vez mais de velocidade. Vi uma placa de posto de gasolina a um quilômetro adiante. A motinho andando a uns 40 por hora e afogando. A estrada não era uma das principais, uma estrada vazia, quase ninguém passava por ali e eram poucos os caminhões que ultrapassei, resultado era um medo gigantesco. Cheguei rindo como um louco, as gargalhadas até mais ou menos dez metros de um posto de gasolina de duas bombas, no meio do barro no que parecia ser uma fábrica de soja ou qualquer coisa do tipo. Muita alegria.
Federal no final das contas estava a um pouco mais do que diziam as placas e não demorei nem cinco minutos até chegar lá. Procurar uma seguradora era a missão. Percorri praticamente toda a cidade, fui em bancos, seguradoras e até uma que se chamava sociedade de seguradoras do não sei quanto. Nenhum lugar fazia seguro de viagem pra moto. Claro ninguém é louco de viajar sozinho de moto.
Finalmente, uma última tentativa me levou a uma seguradora minúscula que fazia o tal seguro, fiquei morrendo de apreensão até a mulher me entregar os papéis, fui felizmente muito bem atendido, uma exceção na argentina. Já devia ser meio dia passado, não sei quanto tempo perdido por causa do tal seguro. Bom, eu sabia que isso poderia acontecer e assumi o risco, deu no que deu.
Parti em direção a Uruguaiana, ou melhor, Paseo de Los Libres, antes de Uruguaiana o último destino antes de chegar no meu querido Rio Grande. Era por volta de duzentos quilômetros ou mais, então fiz por volta de cinquenta quilômetros e achei um posto logo depois de um trevo gigante sendo reformado onde não havia placa nenhuma e por sorte não errei o caminho. Abastecido fui ansioso pra chegar na minha terra, estava louco pra passar por Uruguaiana e seguir em direção a São Gabriel, e sabe, foi fácil. A saída da argentina foi ridícula, uns carimbos e já estava cruzando a ponte.
-Queeeero gaita, de oito baxos! Pra ver o rrrrronco que saí!!!
Eu realmente cruzei a ponte num sorriso até os calcanhares, me senti seguro já de ter conseguido informação com alguns gaúchos, pronto, ali estava tranquilo.

Abasteci na saída de Uruguaiana e melhor não se animar muito, faltavam por volta de 700 km ainda no mesmo dia e quando saí de Uruguaiana era umas quatro da tarde. Extremamente tarde.
Peguei a 290 e fui a tudo que pude, era o último trecho da viagem e mesmo com os barulhos da moto eu seguia louco, correndo. Acho que a embreagem estava comendo a ter problemas, pensava que seria impossível voltar, impossível. Conversava sozinho com a moto, precisava me aguentar até em casa, lhe prometi uma manutenção assim que possível, no sábado pela manhã, provavelmente. Parei em São Gabriel tentando ligar pra uma certa pessoa, queria fazer surpresa e queria ter certeza de que não haveria desencontro, perdi uma meia hora tentando encontrar um telefone publico que funcionasse e nada. Pronto, nem no cartão, botei crédito no celular e a desgraça não funcionava. Além disso, uma internet gratuita é impossível no brasil, quase impossível, pelo menos.
Acabei deixando de lado e segui diretaço. A pista na 290 é pouco esburacada, normalmente boa, as vezes com trechos ruins. Segui e segui, parando apenas pra abastecer pedindo sempre informação de quantos quilômetros até o próximo posto de gasolina, acabei seguindo até muito tarde da noite, onde em Eldorado do Sul já era tarde e a moto estava quase sem gasolina. Tinha medo do horário que os postos de gasolina iriam fechar, sem certeza de quanto mais poderia andar. Ali encontrei um posto de gasolina aberto e um querido tio que conversando mostrou-se um viajante de moto, parei de pé e me dei conta que a pizzaria do cara era cheia de decoração de moto. O cara era dos meus, alegria. Ofereceu qualquer tipo de ajuda que fosse necessária, uma comida numa hora dessas e contou rápidas viagens.
Tinha certeza que em porto e ali pela região da metrópole estaria tranquilo com relação a gasolina, mas antes disso, bah, era um sufoco. Sempre apostando que daria tempo de chegar pra abastecer no seguinte.
Cheguei em porto por volta da meia noite passada, não encontrei nenhum posto de gasolina próximo e já fui em direção a Canoas. Foi a roda girar umas vezes tocando a 116 e já me senti em casa e seguro, sem mais aquela agonia de não conseguir. Já era tarde mas por ali era fácil encontrar gasolina e pedir socorro. Abasteci em Canoas e fui, Esteio/Novo Hamburgo me esperavam sem saber.
Simples chegada, sem muita delonga, aquele orgulho de estar, chegar perfeito, chegar a tempo.

quinta-feira, janeiro 10

Segundo dia

Acordei naquele hotel bacaninha, tinha no dia anterior buscado entre dois hotéis  mas era realmente no meio da cidade e se tratavam de hotéis praticamente de luxo, custo do pernoite saiu por volta de dizendo e oitenta reais, junto com estacionamento, cama, wifi e café da manhã. O café foi café mesmo e um único sanduíche, com quatro fatias de queijo e umas duas ou três de presunto, realmente imaginava que poderia ser péssimo precisar de banheiro no meio do nada, dessa forma pensava apenas em sair e me mandar naquela manhã.

 A moto precisava de uma troca de óleo urgente e claro que eu não estava interessado em me meter nisso, fazer aquele lambuzo por qualquer lado ou sem ter certeza, além da trabalheira que era. Primeira descoberta foi de que os postos de gasolina da argentina são iguais aos do chile nesse sentido, não trocam óleo de moto, é preciso buscar um mecânico.
Encontrei um bruxo de viajantes loucos que ficou feliz em ajudar, foi coisa rápida mesmo, a maior delonga foi o papo furado e o cara mostrando que o club de BMW do Brasil sempre volta e da uma passada por ali, comentando sempre que se ele for viajar pra outras bandas ele consegue hospedagem com qualquer um dos caras do clube praticamente. Resultado da manhã, etinerário atrasado, ao invés de cair na estrada as oito, acabei começando a andar por volta das dez e meia, me perdendo no centro de Mendoza.
Realmente estava muito atrasado e a ideia de chegar antes do natal poderia estar correndo risco maior do que já estava.
O trajeto foi: Uspallata, Mendoza, La Paz, San Luis, Villa Mercedes, Sampacho, Rio Cuarto, Geneal Cabrera, Villa Maria, Las Varillas, San Francisco, Santa Fé, Paraná, Federal, Paso de Los Libres, Uruguayana, Alegrete, Rosário do Sul, São Gabriel, Vila Nova do Sul, Pantano Grande, Minas do Leão, Eldorado do Sul, Porto Alegre, Esteio, Novo Hamburgo.
Acabei saindo tarde de Mendoza e a autonomia da moto era bem limitada, apenas 200km, resultado era que quase todo posto de gasolina eu parava pra encher o tanque e lubrificar a corrente. As paletas começaram a apodrecer, estava levando a mochila ainda na garupa, só apoiada na moto, o que era uma verdadeira merda, qualquer desnível na estrada deslocava a mochila um pouco e me incomodava. Depois de subir e descer as cordilheiras e andar por volta de mil quilômetros cabei parando numa ferragem pra comprar umas cordas e finalmente amarrar a mochila na moto.
Além disso comprei as ferramentas pra estirar a corrente da moto. Por volta do fim da tarde eu saía de algum tipo de vila entre Villa Mercedes e San Francisco. Queria chegar em Uruguayana ainda no mesmo dia, mas sabia que era impossível. Mantive a mão numa média de 100 a 120 km/h, o que é muito para a pequena guerreira.
Cheguei em San Francisco e descobri uma infestação de algum tipo de inseto que segundo eles só saía qunado tinha humidade, o negócio é que o posto de gasolina de San Francisco estava absolutamente cheio deles o que formava uma espécie de tapate sobre o chão do posto de gasolina e uma chuva que fazia o capacete praticamente pesar de tanto bicho morto caindo sobre ele. Abasteci e segui viagem já tendo certo que Uruguayana seria impossível. Faltava por volta de cem quilômetros pra chegar em Santa Fé, e desde Paraná uns 500km até chegar em Uruguayana, sem falar que não sabia como funcionava o horário de atendimento da aduana, de forma que poderia chegar e não ter como voltar  nem seguir viagem. Acabei andando loucamente durante a noite até Santa Fé, era um caminho ainda em alargamento, uma estrada que era simples estavam duplicando. Os caminhões eram praticamente meus únicos companheiros e na maioria das vezes não eram nenhum problema, além de sinalizar quando era possível fazer ultrapassagem também não se metiam em meu espaço de pista. O peso da moto deve ter dobrado, tamanha quantidade de insetos que se grudaram, ou na jaqueta, no capacete ou no para-brisa da moto.
Foi chegar em Santa Fé que abasteci e resolvi que chegava em Paraná. Segundo a rota que eu fazia olhando apenas pelo google maps, eu vi que o caminho se estendia próximo de um rio, e imaginava que tinha um túnel por ali, mas não era garantido e também não havia me informado sobre isso. Acabei tomando as ruas certas de primeira, apenas guiado pela precária sinalização de trânsito argentina, felizmente encontrei. Túnel para o Paraná. Alegria. Além dessa opção seria de balsa, que provavelmente nem funcionava as dez da noite. Cheguei em Paraná e andei um pouco, não gostei da cidade, parecia Sapucaia do Sul, só que maior, um estilo tão feio quanto aquele.
Me informei pelas ruas e encontrei um hotelzinho que deveria ser barato. Barato era, perto do preço no Chile, mas nossa, que lixo de hotel. O atendimento era tão bom quanto se a cidade fosse tomada de zumbis, o estacionamento do hotel ficava a quase uma quadra dali, um telhado quebrado em vários pontos, o chão era praticamente puro barro, salvo algumas partes que havia um princípio de concreto. Não havia nenhum veículo estacionado e me chegou a dar pena de deixar a guerreira por ali, prendi na corrente e com sorte nada de mal aconteceria. A noite chegou pesada quando me deitei na cama só pra olhar tv, quase não consegui manter os olhos abertos pra comer os pasteis, a única refeição do dia. O café da manhã foi literalmente só café, e assim que pude, já estava na estrada. Faltava só mais um dia, precisava chegar, precisava.


segunda-feira, janeiro 7

Primeiro dia

-Bah che, eu to pensando em comprar uma moto ali por julho, mais ou menos.
-Julyo? Por que tan lejo?
-Ah, sei lá, mais tranquilo, sereno, qualquer coisinha pequena mesmo, só pra poder se movimentar e também pelo gosto de uma motinho né.
-Mejor compremola ahora.
-Ahora?
-Si, despues de la feria ya debemos tener la plata y listo.
-Si?
-Claro! hay que vivir ahora, julyo, jajajjaja que sea ahora y listo.
-Ya... bueno, bien, se tu lo dices, mejor que sea ahora.

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-Estaba piensando y sabe que? Se voy a comprar la moto, mejor me voy a brasil con ella.
-Que?
-Si, ya que voy a comprarla, me voy a brasil con ella, siempre quise hacer una viaje asi, mejor la hago ahora y listo.
-Ya... pero no tengo como convencerte de que és peligroso y seria mejor entonces de auto, aun que un auto chico?
-No.
-Ya.

Assim aconteceu, em um dia eu desejei uma moto pequena, pra meio ano depois, e depois de uma semana estávamos procurando por uma motaça de umas mil cilindradas. Acabei encontrando uma de 250 que caiu como uma luva, mais barata, leve, e gostei dela, simplesmente gostei. Pronto, tentei negócio e por uma série de probleminhas não consegui compra-la a tempo de fazer revisão, acabei buscando uma outra moto desse mesmo modelo, a querida pequena guerreira Yamaha Star 250 ano 2010. Em um dia deixamos o dinheiro, no dia seguinte pela manhã concluímos os tramites legais, já durante a tarde estava a caminho das cordilheiras.

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A parte mais insana, irresponsável, completamente desaconselhável e estúpida, foi o planejamento. Praticamente inexistente e nulo. Parei uns dias antes pra olhar no google maps uma possível rota. Olhei e vi o que me parecia geograficamente a menor distância possível, utilizando mais retas e alguns caminhos de estradas menores. Cheguei a decorar alguns trechos, pois levaria apenas o celular e apesar de pensar em comprar mapas, na realidade não queria parar e 'perder tempo' de fazer qualquer coisa.

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Nesse trajeto de ida as coisas foram bastante rápidas e loucas. Começando pela já explicada compra da moto, que foi literalmente de um dia para o outro. A revisão técnica foi de boca, apenas perguntei ao antigo dono se ela estaria boa o suficiente para uma viagem até o brasil, ele respondeu que sim e felizmente não havia mentido. Por volta das onze da manhã de quarta feira dia 21 de dezembro de 2012 os tramites legais da venda foram finalizados, faltava a notificação legal para saída da moto para o estrangeiro, já que ficou em nome de meu primo pois ainda não tenho residência no chile. Tentamos fazer seguro num banco, que não foi possível por falta justamente de RUT, no caso, ser residente chileno.
Dane-se, por volta das três da tarde estava de mala pronta, sem a cuia por falta de espaço, direto nas paletas uma mochila de provavelmente dez quilos ou mais entre roupas, um segundo prometido capacete e umas poucas bugigangas mais.

Chovia e meu maior medo era olhar as cordilheiras no mapa e se dar conta da distância e altura e frio e tudo.
Meu caminho foi pegar Los Andes, uma parada ainda em Rio Blanco uns 60km da fronteira e seguir para as então geladas molhadas e escorregadias cordilheiras. Alegria foi de descobrir que a jaqueta de alpinista do Juan funcionava muito bem, a única parte do corpo que não sentia frio era o peito, um alívio, considerando o perigo da coisa.
Friosito jóia
Meus dedos dos pés aos poucos foram doendo e doendo mais, depois chegou num ponto que não os sentia mais, não sentia nada, isso sim dava medo. Mais medo veio quando comecei a sentir frio no peito, justamente a única parte que pensei estar bem equipada, sempre pensava em parar um pouco pra me aquecer, pois o que realmente esfriava não era chuva nem neve, era o vento. As mãos com luvas para trilha, são boa proteções mas não esquentam nada e são permeáveis, os pés perfeitamente protegidos com uma lona chamada allstar. Quando deixou de doer e passei a não sentir nada nas extremidades foi que me apavorei e comecei a movimentar os dedos loucamente até voltar a sentir dor. Ufa, não aconteceu nada de mais, só um pouco de frio, heheheh.

Um ônibus de turismo brasileiro havia cruzado para
o lado chileno, algum paulista ajudou com a foto 

Essa parta de subida foi bastante incrível, por enfrentar o frio e passar por vários caminhões gigantes subindo as curvas fechadas da estrada ladeira a cima. Os caminhões andavam a 10 km/h eu a 30 km/h ou mais o que era ultra rápida para a situação.
A primeira vitória foi chegar ao topo do lado chileno e ver o túnel que faz a divisa chegando, depois a placa de bem vindo a argentina no meio do túnel e aí então o primeiro posto de polícia da argentina. A conversa foi relativamente rápida, o cara me xingou por ser tão imprudente de fazer a viagem com chuva e ainda por cima sozinho e perguntou se tinha seguro, menti que sim e me deixou passar apenas com um papel de carne anotado o número da placa.
Poucos quilômetros mais adiante a aduana argentina. Pensei que minha viagem cairia por terra por não ter seguro e me obrigariam a voltar, mas não foi isso, eles não pediram o tal seguro e incrivelmente encheram o papel de carne de carimbos que foi entregue no último posto policial descendo as cordilheiras do lado argentino. Desde que estava descendo, meu desejo era descer cada vez mais, pois sentia menos frio, o tempo ia melhorando e aparecia um belo sol.
Não era tão tarde, acontece que as cordilheiras realmente são um muro de clima e o que acontece nas cordilheiras pode ser bem diferente do que acontece poucos quilômetros dali.

Praticamente todas as paradas que digo que fiz foi para abastecer, a moto tem um tanque pequeníssimo, de apenas dez litros de gasolina e não tem marcador, o que significa que deveria ter no mínimo ideia de quanto fazia por média pra poder seguir tranquilo. Era uma média baixa, 20 km/l. Autonomia limitada a 200 km.
Parei em Uspallata no primeiro posto de gasolina que encontrei, estava preocupado porque durante a subida das cordilheiras a moto já dava barulhos de corrente batendo no protetor, o que significava que deveria estica-la o mais rápido possível ou corria o risco de cair a corrente ou em pior caso cair um tombo por qualquer trancasso que pudesse acontecer. Como um motoqueiro muy experiente, eu não sabia estirar a corrente. Imaginava como fazer mas não sabia como, depois de por gasolina e pagar com cartão internacional, pois também não tinha muito dinheiro argentino, encontrei com dois motoqueiros argentinos muito gente fina que me ajudaram a estirar a corrente, ou melhor, eles fizeram o trabalho e eu aprendi como fazer. Também consegui trocar grana com eles e pude só me preocupar em depois trocar o óleo e comprar lubrificante para corrente. Esse tipo de coisa básica que se faz antes de qualquer viagem.
Saí de Uspallata por volta das oito ou nove em direção a Mendoza, meu objetivo do dia. Pensei que fosse rápido mas não, demorou mais uma hora e tanto que cheguei até a secar antes de chegar na cidade.
Começava a anoitecer a logo era um breu absurdo durante todo o caminho de descida do lado argentino. Segui vários caminhões e trepidei sempre que qualquer carreta passava pelo lado, sem nunca saber quanto estava exatamente de algum paredão.
Nem tive a oportunidade de ver Mendoza, cheguei no escuro e passando pelo centro logo me meti num posto pra abastecer e pedir informação de hotel. Cheguei num hotel até bastante confortável, o que foi ótimo depois daquele frio nas cordilheiras, tudo o que desejava era um bom banho quente e uma cama. Tive meu desejo saciado e dormi como uma pedra, perdendo o horário de saída do dia seguinte...