segunda-feira, agosto 27

Ironia natural, as mortes e as vidas

Estava guardado. Ema série, um conjuntinho de preto básico bem macabro e duro. Aos que não querem se ferir com as lembranças dos que se foram, parem aqui.
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É no mínimo irônico que o tipo de sangue que seja doador universal seja um receptor único. É como se a natureza quisesse exterminar os bonzinhos, nessas horas faz sentido um deus qualquer, daqueles sempre temidos e com lógicas bizarras.
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Não é de se imaginar o que passa pelo peito de quem realmente sofre com essas situações
Ter dentro de casa um momento de vida ou morte, a definição clara do jogo, o continue pro game over.
São turbilhões de possibilidades, do chimarrão que se tomaria, a opinião que se ganha durante uma janta.
Quem sabe seja justamente aquelas horas de arrependimento por não ter dado o devido respeito, não ter dado a atenção necessária e aproveitado o momento que se viveu ali, no tempo que se compartilhou junto da pessoal querida.
É, uma coisa que vem pesando no lombo, é a forma com que gastamos nosso tempo. Jogar tudo que é coisa é legal, mas não pode ser tudo, não pode ser o centro. o centro parece que deve ser o ponto em que todos se envolvem, em que as vidas são unidas em relações que como lações de um grande presente, se entregam uns aos outros em cada vivência.
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Destempo, disse a pequena
Talvez esse seja o melhor termo, aquela coisa de não ter dito, não ter feito, o pior arrependimento, aquele de não ter feito algo por alguma falta de coragem, por alguma outra razão que no fundo se sabe, é uma desculpa.
Mexam-se! Arrisquem!
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Agora, temos um a menos na família, um cara grande e gordo que deixou um buraco proporcional em nossos corações. Sim, senti falta dele, por mais que o encontrasse tão burro para tantas coisas, acho que sentia de qualquer forma uma natureza boa no fundo daquele poço de banha. Ok, ele era bem gordinho,  talvez deva falar menos disso.
O pouco que soube dele, foi o bastante para sentir o quanto uma pessoa tem de histórias a contar de suas vidas. É aquela coisa de valorizar cada um dos caminhos que cada um traça.
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Veio sorrateira, aos poucos se aproximava
Ela ficou ao nosso lado, durante alguns anos
Sabíamos, sentíamos de alguma forma, um certo receio
Não se pode ignorar que algo ocorria
Algo passava por aquelas vidas e deixava mal cheiro
Não eram seus flatos ediondos
Espreitando por entre os negócios, por entre dinheiro e mulheres?
Chegou em balaços, nas costas
Na cabeça foram dois
Lá estava o nosso querido saquinho de banha
Nunca é bonito, nunca pode ser, isso sempre é horrível
São revoltas que aparecem dentro do estômago
Visível destruição causada nos peitos dos queridos
Assim veio, numa tarde quase quente a encerrar uma história
Foi um ponto e vírgulo aos que o conheciam, uma falta de ar
Na realidade precisamos de esperanças, pouco importa o resto
Uns ficam com seus deuses, com suas crenças,
Hoje, acho melhor pensar que o pequeno gordinho que ele recém tinha criado,
Seja a esperança dos amados
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Morrer é um negócio muito fácil. Parando pra analisar a quantidade de coisas que se poderia acontecer todos os dias, diria que é incrível ter tanta gente viva. Na realidade é meio louco pensar dessa forma retrancada, buscando aqueles clássicos argumentos de que somos frágeis. Quem sabe só pensamos assim porque não precisamos mais ser tão fortes, de uma forma, de outra forma. Tudo tão mais fácil, tudo tão mais simples.
Um velho chamado Don Juan, hoje mesmo falou comigo. Contou brevemente uns anos de sua história. Como estava na argentina trabalhando como garçom. Como se transformou em carpinteiro, como depois se tornou mestre de verdade em carpintaria. O quanto fez com seu tempo, o tanto que conheceu, viajou. Cada curto capítulo, notei uma coisa em comum. Ele simplesmente parava numa vírgula e contava:
", nesse tempo, pensava em fazer isso, estava interessado ..."
Era só isso, ele estava afim de fazer certas coisas e tudo acabava acontecendo como ele queria, a vida dele foi montada no que ele queria fazer em cada momento da vida, e aos poucos foi de fato fazendo, pouco a pouco, ano a ano. O velho deve ter hoje uns 89 anos, mais são que eu, mais seguro de sí que qualquer cara que conheço. Sábio, tranquilo. Confesso, gosto dessa tranquilidade, dessa história, mas bueno, melhor seguir na minha antes que apodreça um jovem ansioso. Mas isso seria outra história.
Bueno, no final dos curtos capítulos, me dei conta do quão se pode resumir sua história, e como os anos passam rápido nos lábios de um velho que fala devagar. Quase podia ver as suas lembranças passando diante de mim quando se apegava a certos detalhes, as conversas que mudaram sua vida, provavelmente são reproduzidas fielmente ao que passou.
O velho mijava sangue a poucos dias, disse que estava menstruado e riu bastante. Agora, são e com saúde pra vender.
A morte ainda o espera, inevitavelmente, mas o cara é tão agarrado a vida que quase posso pensar que antes dele, vou eu.
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Dentre vivos e mortos, todos morreram.

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